sexta-feira, 1 de junho de 2007

Eram lá percalços seus...

Quinta-feira, 08 de março de 2007. Dia Internacional da Mulher. Data de comemorações extremamente discutíveis no que toca a tão clamada igualdade entre os sexos. Data também da visita do ilustríssimo presidente norte- americano George W. Bush a terras tupiniquins, ou tupinambás, ou qualquer outra denominação aleatória derivada do tronco tupi (1).
Mas o que me leva a escrever neste dia de tanta algazarra política, social, cultural, ambiental (vide Greenpeace no monumento do Ibirapuera) tem um fundo muito mais humano e muito menos humanitário, palavra da moda.
Egoísta e comodamente instalada em meu pequeno mundo paralelo, um tanto Exupéry, observo toda essa agitação, inconcebível para minha alma de poeta, e pego-me pensando no exímio talento do ser humano de culpar outros por seus percalços. Sim, eu também inflo a massa das vítimas em potencial. Hoje mesmo, ao demorar 80 minutos para chegar a universidade, presa no trânsito já sabidamente caótico da “megalópole frenética”(2) culpei o tal chefe de estado, e também o nosso e todos os outros por serem chefes de estado, culpei motoristas de viaturas policiais, culpei os que culpavam o presidente ianque e os que nem sabiam dele, culpei as mulheres desse tal dia internacional, culpei aquelas que queimaram soutiens e obrigavam-me hoje a não estar em casa cozinhando, mas no trânsito correndo atrás de meu lugar ao sol, horas mais tarde vim a saber por um amigo que mulheres grávida também tiveram culpa, culpei burgueses e flagelados, afinal, tive bastante tempo pra isso. Em dado momento, quando o trânsito andou e o vento me fez despertar de meu surto dêitico (aproveitemos São Paulo, abençoado lugar onde, com uma boa dose de sorte, ainda podemos andar de vidros abertos em 5 ou 6 vias rápidas) constatei que, sabendo da possibilidade de algum caos, eu mesma poderia hoje ter-me antecipado na saída assegurando minha pontualidade. Mas claro que ao justificar o atraso, larguei mão do “mea culpa” e culpei todos os supostos culpados e quantos não estariam nessa hora culpando a mim, de forma mais ou menos abrangente, por algum motivo?
Humanos: se sofremos por um amor que, por mais que tenhamos insistido, não nos quis, a culpa não é nossa que não demos paz nem pra nós mesmos , nem pra pobre criatura, mas sim do ser ingrato que nos feriu tão profundamente.
Uma queda profissional dificilmente é motivada por nossa própria incompetência ou descaso e, sim, por aquele chefe ou colega fascínora.
Exemplos comuns que há aos baldes em qualquer canto de nossa vida e existirão sempre, como se fosse uma reação inerente a espécie humana. Nós todos, continuaremos culpando muitos e sendo culpados por outros tantos por motivos muitas vezes desconhecidos pelos algozes mas que poderiam ser complicadíssimos para a vítima, não fosse ela uma pobre vítima.
Culpar segue sendo uma boa desculpa.

(1) referência aos ensinamentos do mestre Eduardo de Almeida Navarro. Em tempo: mestre, aqui, não é título, é admiração; ele é livre-docente.
(2)expressão encontrada em Leonardo Leon, poeta neo-beatnik, cuja literatura chegou a mim na adolescência pelas mão de Patrícia Tavares, hoje historiadora ou cientista social, não sei ao certo.

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