domingo, 29 de março de 2009

Reflexão inacabada sobre a hipercorreção

amor: atração afetiva ou física que, devido a certa afinidade, um ser manifesta por outro; atração baseada no desejo sexual; afeição e ternura sentida por amantes; aventura amorosa; afeição baseada em admiração, benevolência ou interesses comuns; calorosa amizade; forte afinidade; a pessoa ou a coisa amada ou apreciada (tb. us. no pl.); comunhão íntima, coesão com o universo; devoção de uma pessoa ou um grupo de pessoas por um ideal concreto ou abstrato; interesse, fascínio, entusiasmo, veneração; demonstração de zelo, dedicação; fidelidade; um deus ou a personificação do amor [Cupido (na Grécia, Eros), Vênus (na Grécia, Afrodite)]

paz: relação entre pessoas que não estão em conflito; acordo, concórdia; relação tranqüila entre cidadãos; ausência de problemas, de violência; estado de espírito de uma pessoa que não é perturbada por conflitos ou inquietações; calma, quietude, tranqüilidade;



E se o amor for simples, apenas? Calmo, retro-alimentado, sem tramas ou trapaças? E se o que vemos for só a verdade, tão genuína que leva à dúvida? E se for a paz que sempre buscamos a essência daqueles olhos sem segredo? E se a imagem de meu sorriso trouxer-lhe luz e o som de minha voz nortear seus passos? E se for meu amor seu único caminho, o desejo mais puro? E se formos nós o destino e a escolha recíproca? E se tudo for assim porque nossas almas se reconhecem e então o amor é simples, leve? Céu de outono. Mar. Imensidão.

sexta-feira, 27 de março de 2009

Metal contra as nuvens
Sei que vai passar mas, enquanto dói, escolho músicas, encanto o tempo, sobrevivo.
Queria saber explicar, antes: saber verbalizar, mas é tão imenso que meu raciocínio sucumbe e meu coração grita.
Contemplando a inexplicável beleza azul, céu de outono, tudo se torna sonho e eu amo e acredito.
Talvez seja a claridade da manhã, a luz quente desses dias, meu alimento, meu propósito, minha paz.

quarta-feira, 25 de março de 2009

00 às 4

Terminava mais um dia. Outro daqueles inertes em que todas as decisões imediatas e necessárias eram arrastadas para o dia seguinte. O problema é que nesse momento todos os dias pareciam iguais. Tinha o medo, tinha sei-lá-o-quê impedindo-a de seguir seu rumo, ir embora para qualquer lugar, mas ir. O ar viciado a intoxicava, a beleza prometida feria. Já não queria mais acreditar, não podia. Mas alguém entendia? Não, evidentemente, não. Ela não era má nem egoísta, também não almejava a benevolência de mártir:era apenas humana e bastava.
O dia acabou, para onde ir agora? Consultava sua vontade. Não havia vontade. Dentro daquela história, nada mais a pertencia. Sentia profundo desejo de começar de novo. Nada ali seria diferente. Não importava mais. Queria leveza. Queria mais que tudo sua vida. Um novo começo de sonhos só dela. Mas como não se sentir só quando o silêncio cortante da madrugada era a única companhia para suas noites em claro? Precisava do céu profundamente azul, imensidão. Manhãs azuis de outono, em paz, sem dor, sem medo.

segunda-feira, 23 de março de 2009

I'm glad

É por vocês, por cada um de vocês que sigo acreditando em mim. Tudo faz sentido porque os tenho e amo e consigo, assim, vislumbrar a lógica no caos. Encontrar e reuni-los todos, tão perfeitos, em uma só vida torna possível a utopia, possibilidades infinitas. Dessa forma sou feliz, imponderável: estou feliz no limite do abismo; e o que desejo além disso é muito pouco... talvez todos juntos, em mais um domingo de céu claro após nuvens, inteiros, intensos, com seus sorrisos e suas farpas, com seus olhos que me fazem acreditar. Desejo todos, todos vocês que amo desse modo tão indizível, todos os que estão aqui, por todos os caminhos, a qualquer instante. Sim, são vocês... não haveria de ser mais ninguém. A grandiosidade é absoluta.

domingo, 22 de março de 2009

Se é o preço a ser pago por minha vida, aceito, pago em dobro. Minha vida vale tanto... não há preço, há prece.

quinta-feira, 19 de março de 2009

Sebastiana quebra-galho



Precisa-se encontrar uma boa explicação. Não que faltem motivos ou razões, o problema aqui é convencer. Argumentos são necessários, estratégias conceptistas são bem-vindas. É imprescindível confessar os crimes prescritos apenas para satisfazer o poder inquisidor do júri.
É preciso, porém, delatar despudoradamente, com requintes de crueldade. (Exponha-se. Destile o descontrole. Torne pública sua vergonha. Renda-se ao medo. Convide os vampiros. Mostre fraqueza. Seja desleal. Pueril. Conserve sempre a vileza. Guarde um trunfo e não conte a ninguém. Não confie.)
Sim, eu tenho culpa. Padre, eu pequei. Tenho culpa e preciso de ajuda para ser melhor. Pequei, penitencie-me, preciso encontrar o perdão. Não sei para onde ir, não sei o que estou fazendo, são apenas rompantes, não sei pensar. Veja: não tenho esse sublime equilíbrio, tampouco consigo enxergar a solução obviamente acertada para as dores da alma. Fosse eu um pouco menos descontrolada e paranóica, perguntar-lhes-ia o que fazer, sabidamente consultariam seus manuais para humanos perfeitos e teria uma resposta. Simples, tão simples. Mas, ora, pobre diabo sou eu que não entende, não há como errar. Tudo está pronto, são regras. Não pense, não queira, não ouse. A pós-modernidade é neo clássica, os sentimentos devem ser neo clássicos. Aurea mediocritas. Os problemas vão existir sempre, o que é que você quer, o amor perfeito? Tola, tola e irracional. E agora essa estória de sentir, não suportar, doer... vá cuidar do jantar! Diga-me então o que pretende? Pensa que consegue sozinha? Pobre criança inconstante. Você é fraca, covarde. Precisa tanto desse controle, você precisa, compreende? Sozinha por aí, imagine! Tudo o que lhe é feito é porque você merece. Pare já com essas falas bem construidinhas, com esse léxico pedante tirado dessa tal literatura que não entendo, pensa que sabe mais que eu? Pensa que sabe tanta coisa. E não me venha com essa humildadezinha ensaiada, não. Conheço você, conheço muito bem. Agora, por mais um caprichosinho, princesa, joga tudo para o alto. Tenho eu de ir consertar, tenho eu, mais uma vez, de assumir o controle da sua vida, afinal, se não sou eu você se perde nessa ilusão absurda de felicidade. Não, não dá para falar com você, não dá para explicar nada a alguém assim tão fora da realidade. Chega! Faça uma lobotomia, queime seus livros, analfabetize-se, dê-me aqui essa tal poesia, o amor e toda a santidade, vista um espartilho, peça perdão pelos erros daquele que a protege, peça-me a bênção, beije-me a mão, cubra o rosto e vá para o seu quarto.

terça-feira, 17 de março de 2009

Explosão

Necessária, energia explosiva. Talvez seja a postura mais simples, ninguém exige constante ponderação. Enquanto a cólera é compreensível e perdoável, o equilíbrio precisa ser provado a cada instante. Mas esta sou eu e gosto do que sou. Gosto do silêncio, prefiro sentir sozinha, acerto-me como posso sem barulho desnecessário, sem tensão extremada.
Mas neste momento, neste exato momento Álvaro de Campos traduz minha alma.




NÃO: Não quero nada.
Já disse que não quero nada.

Não me venham com conclusões!
A única conclusão é morrer.

Não me tragam estéticas!
Não me falem em moral!

Tirem-me daqui a metafísica!
Não me apregoem sistemas completos, não me enfileirem conquistas
Das ciências (das ciências, Deus meu, das ciências!) —
Das ciências, das artes, da civilização moderna!

Que mal fiz eu aos deuses todos?

Se têm a verdade, guardem-na!

Sou um técnico, mas tenho técnica só dentro da técnica.
Fora disso sou doido, com todo o direito a sê-lo.
Com todo o direito a sê-lo, ouviram?

Não me macem, por amor de Deus!

Queriam-me casado, fútil, quotidiano e tributável?
Queriam-me o contrário disto, o contrário de qualquer coisa?
Se eu fosse outra pessoa, fazia-lhes, a todos, a vontade.
Assim, como sou, tenham paciência!
Vão para o diabo sem mim,
Ou deixem-me ir sozinho para o diabo!
Para que havemos de ir juntos?

Não me peguem no braço!
Não gosto que me peguem no braço. Quero ser sozinho.
Já disse que sou sozinho!
Ah, que maçada quererem que eu seja da companhia!

Ó céu azul — o mesmo da minha infância —
Eterna verdade vazia e perfeita!
Ó macio Tejo ancestral e mudo,
Pequena verdade onde o céu se reflete!
Ó mágoa revisitada, Lisboa de outrora de hoje!
Nada me dais, nada me tirais, nada sois que eu me sinta.

Deixem-me em paz! Não tardo, que eu nunca tardo...
E enquanto tarda o Abismo e o Silêncio quero estar sozinho!

segunda-feira, 9 de março de 2009

Após o crepúsculo

Escurece. A razão escurece. Um arrepio irracional domina a lógica inconstante. Por que os medos são tão maiores à noite?
Desde a infância ela nos assusta: temos medo do escuro, dos pesadelos, de ficar só. É seguro o dia, sabemos exatamente o que há em nossa frente, não há mistério, pouco se esconde; pode-se correr em direção ao abismo e parar antes da queda. A luz controla os riscos. A escuridão, porém, catalisa-os. Ali nada é nosso, tudo é segredo e qualquer passo pode encontrar o vazio. No escuro, nossos doces brinquedos tornavam-se monstros; no escuro, nosso futuro perfeito torna-se nebuloso, da escada que a ele conduz só enxerga-se o primeiro degrau, depois dele ascensão, decadência ou abismo são possíveis.
No meio da noite, ouve-se a angústia de uma mulher. Sozinha à beira de seu iminente abismo, ela chora como criança, seu corpo faz-se pequeno, frágil, tentando talvez voltar ao tempo que o medo passava ao acender as luzes. Nunca sentira tanto medo. Todos os caminhos conduziam a incerteza, poderia doer, poderia doer mais e, nesse momento, seu mundo depende dela. Não há algozes, não há culpados, só ela e sua sorte com medo de olhar-se nos olhos.
Dessa vez, ninguém a salvaria. Ela já entendera a distância entre seu mundo e os contos de fadas. Não havia heróis tampouco donzelas a serem resgatadas, nem cavaleiros ou princesas. Havia uma mulher, apavorada diante de uma dor que não podia controlar; diante do amor que não podia suportar.

segunda-feira, 2 de março de 2009

Verlaine original

En Sourdine

Calmes dans le demi-jour'
Que les branches hautes font,
Pénétrons bien notre amour
De ce silence profond.

Fondons nos âmes, nos coeurs
Et nos sens extasiés,
Parmi les vagues langueurs
Des pins et des arbousiers.

Ferme les yeux à demi,
Croise tes bras sur ton sein,
Et de ton coeur endormi
Chasse à jamais tout dessein.

Laissons-nous persuader
Au souffle berceur et doux
Qui vient à tes pieds rider
Les ondes de gazon roux.

Et quand, solennel, le soir
Des chênes noirs tombera,
Voix de notre désespoir,
Le rossignol chantera.

Verlaine

Em surdina

Calmo, na paz que
difunde a sombra dos altos ramos,
que o nosso amor se aprofunde
neste silêncios em que estamos.

Coração, alma e sentidos
se confundam com estes ais
que exalam, enlanguescidos,
medronheiros e pinhais.

Fecha os olhos mansamente
e cruza as mãos sobre o seio.
Do teu coração dolente
afasta qualquer anseio.

Deixemo-nos enlevar
ao embalo desta brisa
que a teus pés, doce, a arrulhar,
a relva crestada frisa.

E quando a noite sombria
dos carvalhos for baixando,
o rouxinol a agonia
da nossa alma irá cantando.