segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Das escolhas

Dias atrás, ouvi uma amiga querida dizer para sua filha de 3 anos que quem escolhe se terá um dia bom ou ruim é ela mesma. Ok, a lógica é perfeita, mas quem nos ensina a escolher? Se nós aqui do alto de nossa maturidade intelectual fazemos tantas escolhas estúpidas, como uma criança saberá fazê-las de modo acertado? Um tanto maldito esse livre-arbítrio, não? Podemos procurar o caminho que desejarmos, podemos tudo, mas o que isso resolve se, por vezes, o caminho que escolhemos para ir ao trabalho pela manhã não era a melhor opção e, por essa escolha, chegamos atrasados, perdemos o prazo do job e ficamos em maus-lençóis? E nada disso aconteceu porque saímos atrasados pois dormimos até mais tarde por causa da esbórnia da noite anterior. Não. Dormimos no horário normal, simplesmente estávamos ali, preparados para nossa rotina e fizemos uma escolha errada, comigo isso ocorre toda manhã: 23 de maio ou Nove de julho? Juro por Deus que me perco nesse impasse diário. Sofro mesmo,creiam. Fico, então, pensando naquelas pessoas cronicamente indecisas e, sim, elas tem muita razão, a indecisão é a lucidez realizada! Não quero dizer aqui que essa postura é invejável, tampouco concordo com ela, mas é lúcida. Ao efetivar nossas escolhas, ficamos, ainda que por um átimo, cegamente apaixonados e depois não há como voltar atrás: aquilo já foi feito. Poderemos, depois, tentar outra coisa, remediar a situação, mas aquela escolha, aquele preciso momento que nos levou a escolher a bela torta de gianduia e não o crème brûlée; que nos levou a dizer sim para essa pessoa e não para aquela, que nos fez optar por uma viagem para a Disney ao invés da festa de quinze anos não voltará mais, nunca mais. Seguindo minha insana linha de raciocínio, vamos lá, argumentos: "e se eu quiser experimentar a torta de gianduia? Não gostando, peço o crème brûlée e pronto!" Pois muito bem, se pedi-lo após a torta, ainda que um único bocado dela, suas papilas gustativas já estarão poluídas e não o saborearão como seria se ele fosse a única sobremesa. Desculpe, nesse jantar a escolha foi feita. "É melhor fazer a festa de quinze anos e deixar a Disney para depois, uma vez que há a vida toda para uma viagem." Certo, mas e o prazer de visitar a Disney aos 15 anos - mesmo porque, se tudo der certo com a sanidade mental da criatura, aos 16, a terra do Mickey já estará definitivamente fora dos destinos almejados - e agora, falando de pessoas, deuses! essa é a mais difícil: tudo pode acontecer! Opções, decisões, qualquer coisa pode dar certo ou errado, qualquer coisa pode ser ou não, o fato é que perderemos sempre. Em toda nossa vida, ao escolher, perderemos. Então volto a minha amiga e sua amada filha: sua mãe tem razão, amor, você escolhe como vai ser seu dia, mas não se frustre se a escolha for errada, será mesmo, com muio mais frequência do que gostaríamos.

sábado, 22 de agosto de 2009

Lucíola

"Incompreensível mulher!
A noite a vira bacante infrene, calcando aos pés lascivos
o pudor
e a dignidade, ostentar o vício na maior torpeza do cinismo, com toda a hediondez de sua beleza.
A manhã a encontrava tímida menina, amante casta e ingênua,
bebendo num olhar a felicidade que dera, e suplicando
o perdão da felicidade que recebera."
(José de Alencar)




As revoluções aconteciam sem que a humanidade pudesse controlá-las. Era uma época difícil em que vagávamos um tanto tontos pela vida imersos em planos e metas de proporções estratosféricas, movidos pelo desejo em todas as suas formas. Andávamos por ali consumindo a vida e a nós mesmos como fantoches pseudo-libertos. Caminhávamos, ou melhor, corríamos, e até sabíamos a direção, mas faltava propósito, aquele apaixonado propósito revolucionário que conhecíamos bem das referências históricas e dos desejos utópicos, vez ou outra, vinha alguém dizer que estava lá, acreditávamos pois duvidar não tinha o menor cabimento.

Em um desses dias, plenos do vazio sistemático da lógica contemporânea, ela apareceu e disse conhecer o amor. Como acreditaríamos naquela mulher com olhos de menina que sorria com lágrimas nos olhos ao falar de seus sonhos e admitia o paradoxo de amar e sofrer com tamanha naturalidade e resignação que a dor tornava-se bela? Como duvidar da languidez mais forte e profunda que qualquer olhar poderia carregar? Naquele dia, apaixonamo-nos novamente por nossas vidas, por nossas histórias, por nossos amores. Ela sorriu e partiu. Retornava aos braços de seu velho conhecido. Retornava, satisfeita, a seu lugar, a seu destino. C(h)ega de tanta luz.(!)