quinta-feira, 19 de março de 2009

Sebastiana quebra-galho



Precisa-se encontrar uma boa explicação. Não que faltem motivos ou razões, o problema aqui é convencer. Argumentos são necessários, estratégias conceptistas são bem-vindas. É imprescindível confessar os crimes prescritos apenas para satisfazer o poder inquisidor do júri.
É preciso, porém, delatar despudoradamente, com requintes de crueldade. (Exponha-se. Destile o descontrole. Torne pública sua vergonha. Renda-se ao medo. Convide os vampiros. Mostre fraqueza. Seja desleal. Pueril. Conserve sempre a vileza. Guarde um trunfo e não conte a ninguém. Não confie.)
Sim, eu tenho culpa. Padre, eu pequei. Tenho culpa e preciso de ajuda para ser melhor. Pequei, penitencie-me, preciso encontrar o perdão. Não sei para onde ir, não sei o que estou fazendo, são apenas rompantes, não sei pensar. Veja: não tenho esse sublime equilíbrio, tampouco consigo enxergar a solução obviamente acertada para as dores da alma. Fosse eu um pouco menos descontrolada e paranóica, perguntar-lhes-ia o que fazer, sabidamente consultariam seus manuais para humanos perfeitos e teria uma resposta. Simples, tão simples. Mas, ora, pobre diabo sou eu que não entende, não há como errar. Tudo está pronto, são regras. Não pense, não queira, não ouse. A pós-modernidade é neo clássica, os sentimentos devem ser neo clássicos. Aurea mediocritas. Os problemas vão existir sempre, o que é que você quer, o amor perfeito? Tola, tola e irracional. E agora essa estória de sentir, não suportar, doer... vá cuidar do jantar! Diga-me então o que pretende? Pensa que consegue sozinha? Pobre criança inconstante. Você é fraca, covarde. Precisa tanto desse controle, você precisa, compreende? Sozinha por aí, imagine! Tudo o que lhe é feito é porque você merece. Pare já com essas falas bem construidinhas, com esse léxico pedante tirado dessa tal literatura que não entendo, pensa que sabe mais que eu? Pensa que sabe tanta coisa. E não me venha com essa humildadezinha ensaiada, não. Conheço você, conheço muito bem. Agora, por mais um caprichosinho, princesa, joga tudo para o alto. Tenho eu de ir consertar, tenho eu, mais uma vez, de assumir o controle da sua vida, afinal, se não sou eu você se perde nessa ilusão absurda de felicidade. Não, não dá para falar com você, não dá para explicar nada a alguém assim tão fora da realidade. Chega! Faça uma lobotomia, queime seus livros, analfabetize-se, dê-me aqui essa tal poesia, o amor e toda a santidade, vista um espartilho, peça perdão pelos erros daquele que a protege, peça-me a bênção, beije-me a mão, cubra o rosto e vá para o seu quarto.